Tem se tornado cada vez mais frequente a divulgação de resultados de estudos que associam a alimentação ao desenvolvimento de algumas doenças, por outro lado, há também uma quantidade considerável de especulações e informações equivocadas a esse respeito. No caso de pacientes com doenças na tireoide, por exemplo, é comum que procurem informações sobre mudanças na dieta que possam contribuir para o tratamento ou mesmo reversão da doença. Mas, será que existe uma dieta para especial nesses casos? Conversamos com a endocrinologista Dra. Patrícia Peixoto, membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia para compreender a relação entre alguns alimentos e as disfunções na glândula.
Antes de mais nada, é necessário compreender as possíveis causas das disfunções. De acordo com a endocrinologista a maior parte delas tem causa autoimune, o que quer dizer que o organismo produz anticorpos contra receptores presentes na célula da tireoide afetando a produção dos seus hormônios. Se, por um lado, na maioria dos casos estes anticorpos reduzem a produção hormonal, causando o hipotireoidismo autoimune, por outro, há outros anticorpos que aumentam essa produção, causando o hipertireoidismo. Dra. Patrícia frisa que não há evidências que relacionem diretamente nenhum alimento específico a causa direta da disfunção na tireoide ou na produção de anticorpos.
“É importante alertar sobre isso, porque o glúten, por exemplo, vem sendo retirado da dieta de pessoas que não tem doença celíaca ou intolerância ao glúten, com a justificativa de que ele poderia desencadear disfunções na tireoide. Nenhum estudo científico hoje respalda esta conduta. Do mesmo modo, não há nenhum alimento que tenha que ser proibido, mesmo se a pessoa tem uma predisposição genética a ter doenças na tireoide”.
Nenhum alimento é proibido, entretanto, o equilíbrio no consumo é fundamental. A especialista esclarece que alimentos que contém isoflavonas, como a soja e derivados, podem afetar a função da tireoide em pessoas que já possuem predisposição genética, entretanto, a proibição não é necessária, desde que o consumo seja moderado. “Em áreas que não são deficientes em iodo, o uso da soja por pessoas com função da tireoide normal não parece trazer problemas. Para os que têm hipotireoidismo recomendamos consumir com moderação, pois o uso da soja pode inibir a função da tireoide e mesmo aumentar a dose de medicamento necessário para a reposição hormonal”. Da mesma maneira, alimentos crucíferos podem causar aumento de volume da tireoide pois possuem glicosinolatos que inibem a captação de iodo pela tireoide, o que favorece o aparecimento do bócio (aumento da tireoide).
“Os principais vegetais crucíferos são brócolis, repolho, couve de bruxelas, couve-flor, nabo e couve. Para quem tem ou não hipotireoidismo, grandes quantidades afetarão sua produção hormonal, mas não há porque suspender o uso. Ainda não há consenso em relação a quantidade, mas alguns especialistas recomendam evitar o consumo diário, limitando a uma a duas vezes por semana”
Assim como não há comprovação de que algum alimento pode ser considerado causador de disfunções na glândula, a Dra. Patrícia afirma que também não há alimentos que possam ser responsáveis por prevenir tais doenças. O que existe, segundo ela, são alguns micronutrientes, como o iodo, necessários para o bom funcionamento da tireoide. “No Brasil o sal de cozinha comum já é iodado de modo a fornecer a quantidade necessária a maioria das pessoas”. Existem alguns grupos que necessitam de atenção especial e que podem precisar de suplementação de iodo, como gestantes e mulheres amamentando.
A alimentação de vegetarianos e veganos exige uma atenção especial em diversos aspectos e nesse caso a Dra. Informa que há um risco maior de não obter os níveis adequados de iodo e, então, podem precisar também de suplementação.
Entretanto, o uso dos suplementos também deve ser feito com cuidado, a médica explica que opções de suplementos com iodo vem se tornando comuns e podem ser compradas sem receita, o que pode ser perigoso. “O uso de doses elevadas de iodo pode causar tanto hipotireoidismo como hipertiroidismo, por isso essa suplementação nunca deve ser feita sem orientação do endocrinologista”. Outros micronutrientes como o zinco e selênio também são responsáveis pelo bom funcionamento da glândula. “Neste caso, estimula-se o consumo de alimentos que os contenham, mas não podemos atribuir a eles o poder de prevenir ou tratar uma doença”.
“Não há dieta específica para garantir que a tireoide funcione bem, exceto pela atenção ao uso de alimentos que contenham iodo”
Apesar de não haver uma dieta especial que seja eficaz para o funcionamento perfeito da tireoide, é fundamental que se tenha uma alimentação equilibrada e sem exageros. Além disso, para cuidar bem da tireoide, deve-se seguir a orientação individual dada pelo endocrinologista e pelo nutricionista. Acompanhamento especializado é imprescindível.
Fonte: Endocrinologista Dra. Patrícia Peixoto, membro da Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia, da Abeso (Associação Brasileira para Estudos da Obesidade) e da Endocrine Society.