Existe o mito, cada vez mais combatido, de que uma alimentação vegetariana, especialmente a estrita (vegana), é incompatível com a infância. O argumento é de que a criança pode sofrer falta de nutrientes, porém, está mais do que comprovado que essa preocupação não tem fundamento, ao contrário. Crianças vegetarianas tendem a ter uma alimentação mais balanceada, sem, por exemplo, o consumo excessivo de proteína comum entre crianças onívoras, de acordo com um estudo realizado pela Universidade de Paris em parceria com a Universidade de Standorf.
PROTEÍNA
Por falar nela, a classificação que separa a proteína em dois tipos, de alto e baixo valor biológico, está ultrapassada. Hoje, sabe-se que o correto é avaliar a digestibilidade de cada aminoácido, nutriente responsável pela formação da proteína presente no alimento. Aliás, uma dieta vegetariana bem calculada, segundo uma pesquisa da Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO), supre a necessidade proteica de crianças e adultos, sem a necessidade de suplementação.
CÁLCIO
A deficiência desse mineral é outra preocupação dos pais de crianças vegetarianas. Muitos ainda acham que apenas o leite de vaca e derivados são fontes de cálcio, mas existem outros alimentos, especialmente semente de gergelim (pode ser consumida in natura e na forma de pasta, conhecida como tahine) e vegetais verde-escuros (couve, brócolis). No mercado também são encontradas opções de leite vegetal enriquecido com cálcio.
FERRO
Mais um mineral erroneamente associado apenas a alimentos de origem animal. Os vegetarianos podem alcançar a dose diária de ferro consumindo leguminosas (ervilha, lentilha, feijões), tofu (queijo de soja), sementes (girassol, gergelim, abóbora) e vegetais verde-escuros. A absorção é mais difícil que o ferro da carne, mas pode ser melhorada com algumas estratégias nutricionais: fazer o demolho das leguminosas por 12 horas (ajuda a eliminar os fitatos, substâncias que atrapalham a absorção do mineral) e consumir na mesma refeição, durante ou logo após, frutas ricas em vitamina C, como laranja e limão. De qualquer maneira, a suplementação de ferro é recomendada pela Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP) para todas as crianças entre 3 meses e 2 anos, independentemente do tipo de alimentação – ou seja, vegetariana ou não, elas devem ser suplementadas com o mineral nesse período. Depois disso, a dose diária pode ser obtida só com alimentação.
ÔMEGA-3
Também está presente em alguns alimentos de origem vegetal, em maiores concentrações nas sementes de chia e linhaça. O óleo de linhaça oferece, em 5 ml, 2,7 g de ômega-3. É bastante! Mesmo assim, a recomendação é dobrar a dose em comparação ao ômega-3 vindo de peixes (confira na tabela). Isso porque o ácido graxo de fonte vegetal é do tipo ALA (ácido alfa linoleico), que precisa ser convertido em EPA (ácido eicosapentaenoico) e DHA (ácido docosaexaenoico).
Assim como o ferro, a SBP recomenda a suplementação de DHA para todas as crianças maiores de 1 ano, vegetarianas e onívoras, em uma quantidade de 250 mg ao dia.
VITAMINA D
A SBP também recomenda a suplementação diária de vitamina D nas doses de 400UI (entre a primeira semana e 1 ano) e 600UI (entre 12) para crianças vegetarianas e onívoras.
VITAMINA B12
É a única vitamina de suplementação obrigatória apenas para vegetarianos, independentemente da idade, pois não é encontrada em alimentos de origem vegetal. Mas, vale a ressalva: mais de 40% da população onívora apresenta deficiência de vitamina B12.
GUIA ALIMENTAR PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES VEGETARIANOS
Disponível na internet, o Guia Alimentar Para Bebês e Crianças Vegetarianos, elaborado pelo Ministério da Saúde e a Sociedade Vegetariana Brasileira (SVB). O acesso é gratuito para que os pais possam manter a alimentação dos filhos completa, sem o risco de carências de vitaminas e minerais, relacionadas, principalmente, ao consumo inadequado de nutrientes devido à uma alimentação não balanceada. Alguns fatores genéticos também devem ser avaliados, já que podem levar a uma absorção ou conversão inadequada dos nutrientes. Porém, são fatores que independem do tipo de alimentação. Ou seja, mesmo uma criança onívora precisa ser avaliada clínica e bioquimicamente por um nutricionista bem atualizado e capaz de adequar a alimentação de acordo com as necessidades e escolhas da criança e dos pais.
*LUNA AZEVEDO é nutricionista materno infantil, atuante em alimentação vegana e vegetariana.